Eu por lá: Londres (1997)


   

    Tinha três anos quando andei pela primeira vez de avião. Chorei a viagem inteira, vá-se lá saber porquê! Fui para Londres com a minha mãe, onde ficámos a viver cerca de quatro meses. Na altura, ela tinha de fazer um tratamento de saúde e agora sei que lhe fui complicar a vida neste sentido. Era uma criança terrível! Nunca estava quieta, amuava constantemente e chorava por tudo. Não tinha noção do que estava ali a fazer e muito menos podia imaginar como esta viagem me ia marcar para sempre!

    Foi nesta cidade que comemorei os meus quatro anos e, quer acredites ou não, tenho memórias bem guardadas desta altura. Jamais me irei esquecer da primeira vez que vi o Big Ben, em que saí da estação de metro e inclinei a cabeça tanto quanto podia para olhar até ao cimo do relógio. Era tão alto! No St Jame’s Park andava sempre a correr atrás dos esquilos na tentativa de apanhar um. Era uma felicidade enorme e um desafio constante. Também gostava muito de dar pão aos patos. Não é difícil perceber a razão deste ser o meu jardim preferido.


    Em Victoria, onde vivia, aprendi a dizer “bye bye”, as minhas primeiras palavras na língua de sua majestade. Enquanto a minha mãe me tirava esta fotografia, acenava e repetia-as para toda a gente que passava para não me esquecer delas. Quanto às questões linguísticas, agora acho muito engraçado porque é que ela insistia para não falar muito alto quando pedia uma “faca” e estavam mais pessoas. É que é muito parecido a “fuck” e podia ser mal interpretada.


    Foi no meio destas ruas frenéticas que aprendi a olhar a diferença com igualdade. Que cabelos azuis espetados (algo que estava muito na moda na altura), roupas pretas e rasgadas, cores de pele diferentes, comidas distintas, línguas que não percebia, era tudo igual e fazia tudo parte do mesmo sítio. Aqui as peças ligam e encaixam todas. Trata-se de uma “não questão”. Durante uns tempos partilhámos casa com uma família negra. Não me lembro do nome da senhora, mas a menina, um pouco mais velha do que eu, era a Eloise. Não falávamos a língua uma da outra, mas dominávamos na perfeição a linguagem universal da brincadeira que duas crianças têm :) Elas ofereceram-me um nenuco pretinho. Foi sempre dos meus preferidos!


    Pode parecer estranho lembrar-me de tantos detalhes, mas a verdade é que sempre fiz para não os perder. Vejo muitas vezes as fotografias e consigo associar muitas delas aos momentos que estava a viver. Há um cheiro, que claro que não consigo descrever qual é, que me transporta automaticamente para lá. Há uma música do Elton John que me causa arrepios, ouvia-a muitas vezes na rua.


    Foram momentos muito intensos. Um misto de dias felizes e de dias de angústia. Não foi nada fácil para a minha mãe e infelizmente tivemos de vir embora antes de ela concluir o que a tinha levado até lá. Tenho o maior orgulho por ela. É uma força da natureza, com uma determinação e coragem que é de louvar. Diz-me muitas vezes que sou uma destemida, mas a verdade é que acho que não teria tido a ousadia que ela teve nesta altura. Um dia, talvez te conte a história dela. 


    O engraçado é que, 13 anos depois, numa viagem em família, é que ela viu a sua situação “resolvida”. Até hoje :) Em 2015, quase 18 anos depois de ela ter ido para Londres (esteve lá quase um ano), decidi que era altura de voltarmos as duas. Fomos, e foi tão bom :) 


    Esta será sempre uma cidade especial para mim. É a minha preferida além fronteiras e sempre que lá vou, de certa forma, sinto-me em casa!

    Quando dizem que não vale a pena viajar com crianças, a prova é esta: de alguma forma, a mensagem passa, tudo se retém e a memória prevalece com o mais importante. Se há algo que tenho a certeza na minha vida, é que não seria a mesma pessoa sem este momento tão marcante. Sim, com três anos.


Uma das minhas fotografias preferidas, de sempre. 

Não tenho palavras para definir a minha mãe. Ainda bem que é minha! 




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