Como visitar o campo de concentração de Dachau
Dachau é uma cidade da Baviera, na Alemanha,
localizada a cerca de 20km de Munique. Lá, foi construído o primeiro campo de
concentração que viria a servir de modelo a todos os outros mandados erguer
pelo III Reich. É, ainda hoje, um dos símbolos mais marcantes do Holocausto.
O Campo de
Concentração
Dachau
foi oficialmente o primeiro campo de concentração, mandado construir por Hitler
logo após seis semanas de tomar poder, em 1933. Foi construído pelos nazis numa
antiga fábrica de pólvora e inicialmente estava pensado para receber
prisioneiros políticos, ou “prisioneiros especiais” como lhes chamavam. No
entanto, com o culminar da guerra, também opositores ao regime nazi, judeus,
jeovás, homossexuais e deficientes foram encaminhados para lá.
Os
prisioneiros viviam em condições desumanas, sob constante ameaça e tortura, obrigados
a trabalhos forçados e a construir armamento militar para ser utilizado na
Segunda Grande Guerra que já então decorria (1939-1945). Uma das formas de
tortura mais utilizadas era a privação de sono, em que os prisioneiros eram
colocados numa divisão, chamada de kishkas,
apenas com a largura do corpo para permanecerem sempre de pé. As razões para
esta prática eram bem distintas, tanto podia ser aplicada por alguém pedir um
pouco mais de comida ou para as SS (tropas de proteção) obterem informações,
sobretudo aos “prisioneiros especiais”.
Tal
como em outros campos de concentração e como é do conhecimento geral, aqui os
nazis usavam os prisioneiros como cobaias para experiências médicas e
científicas. Estes eram submetidos a testes rigorosos e dolorosos que causavam
deficiências e muitas vezes a morte. Para dar exemplos concretos, os
prisioneiros eram obrigados a administrar comprimidos e vacinas para que se
encontrasse cura para doenças como a malária e a tuberculose. Testavam os fatos
que os militares iam usar nos aviões para garantirem que resistiam às altas
pressões atmosféricas. Em relação a estes casos, foi encontrado um registo
escrito de um prisioneiro que dizia que esperava morrer a meio de um destes
testes aéreos. Sabia que, mais cedo ou mais tarde, a morte era o seu destino,
então que fosse dessa forma, em vez de outra mais dolorosa. Mais dolorosa
talvez como aqueles que eram colocados em tanques de água gelada para testar a
reação do corpo até entrarem em hipotermia.
Estes
são pequenos exemplos das atrocidades que ali se viveram e pelos quais tantos
morreram. Entre 1933 e 1945 passaram por lá mais de 200 mil prisioneiros,
oriundos de mais de 30 países. Por fome, epidemias, trabalho forçado,
experiências científicas ou de outras formas, morreram mais de 31 mil pessoas,
sendo que vários historiadores acreditam que o número tenha sido muito
superior.
Quando se avizinhava o final da
2ª Guerra Mundial, perante a “Solução Final” (irradicação de todos os judeus
das terras ocupadas pelos alemães), com a evacuação de outros campos de concentração devido ao recuo das tropas de Hitler, todos os outros campos mais a sul se encontravam lotados. Dachau começou a receber prisioneiros vindos um pouco de
toda a Europa, nomeadamente do campo de concentração de Auschwitz, na Polónia.
Mais de metade destas pessoas morriam durante a viagem. Vinham centenas de prisioneiros
por vagão nos comboios, sem comida, sem roupa adequada, até sem ar respirável.
Algumas viagens de transição entre campos duravam três semanas, o que era tempo
suficiente para alguns corpos entrarem em decomposição. Basicamente, eles eram
enviados para ali apenas com uma finalidade: morrer.
Os corpos eram queimados no
crematório. No entanto, com a sobrelotação do campo e o número de mortos a
aumentar, chegou-se ao ponto de o carvão acabar e aí começarem a fazer valas
comuns.
Foi precisamente esta a primeira
imagem que a 42ª Divisão de Infantaria do Exército dos EUA teve no dia 29 de
abril de 1945, quando se deu a libertação do campo de concentração de Dachau.
Centenas de corpos empilhados, já mortos há vários dias, muitos em avançado estado
de decomposição.
Levou seis semanas até que os 32
mil prisioneiros que se encontravam neste campo de concentração fossem libertados
e encaminhados para campos de refugiados ou para os seus países.
Vale referir que Dachau teve
efetivamente uma câmara de gás, mas não há confirmação de que tenha sido
utilizada.
A
minha experiência ao visitar Dachau
Quando vamos visitar uma cidade
optamos sempre por ver o melhor e mais bonito desse sítio. Ter um roteiro que
passe por visitar um campo de concentração pode parecer que destoa de tudo o
resto. É verdade, mas é necessário. Visitar um campo de concentração não é fácil,
mas todos o devíamos fazer pelo menos uma vez na vida.
Quando programei a minha ida a
Munique assinalei logo Dachau como ponto obrigatório de passagem. Em 2014 tive
oportunidade de visitar o campo de concentração e extermínio de Auschwitz
(Polónia), pelo que já tinha uma ideia de como seria estar num local como este,
que na verdade é um símbolo de morte e de uma parte negra da nossa História. Não
dá para explicar o turbilhão de emoções que se sente logo ao passar através do
portão com a inscrição Arbeit macht frei
(o trabalho liberta).
Todos os sentidos ficam alerta e
começamos a olhar, agora, para aquele espaço vazio, e questionamo-nos de como
seria quando estava cheio. Cheio de tanto ódio e maldade. Cheio de tantos
inocentes. Cheio de dor e sofrimento.
Ao contrário de Auschwitz, um
local com centenas de visitantes, em Dachau estavam apenas algumas dezenas, o
que fez com que a minha visita fosse bem mais solitária e, numa primeira parte,
mais intensa. Logo dos primeiros edifícios onde entrei, onde eram as celas dos
“prisioneiros especiais”, não havia ninguém. Um corredor enorme seguia para a
direita, outro para a esquerda, com 136 portas fechadas, onde apenas saia uma
brecha de luz por entre os postigos, num local literalmente frio e
evidentemente sombrio. Algumas celas tinham a identificação de quem por lá
tinha passado, como também tinha morrido. Ali estava eu, a imaginar o que teria
acontecido, num sítio que realmente causa desconforto. Apressei o passo e saí
de lá completamente arrepiada. Este momento marcou a minha visita e
provavelmente nunca vou esquecer aquela sensação de nó no estômago, só por
imaginar a solidão e a impotência dos que estavam ali fechados.
Entrei noutro edifício, a chamada
“divisão de passagem”. O local onde os prisioneiros entravam e deixavam de ter
nome e identidade própria, a partir dali eram um número. Deixavam todos os seus pertences em troca de
um uniforme. A única coisa que passava a ser realmente sua para sempre.
Era feita uma contagem diária.
Todos tinham de comparecer, até os que se encontravam em pior estado de saúde,
caso contrário eram violentamente agredidos. Outra das coisas que mais me
marcou aqui foi ver uma mesa com uma vara, utilizada para espancar os
prisioneiros, notavelmente utilizada, com as pontas a definhar.
Ao longo desta secção, podem ler
imensa informação sobre o campo de concentração, as práticas, as pessoas, no
fundo, sobre a realidade do dia-a-dia. Já na parte posterior, há réplicas de
como eram os “barracões”, 36 no total, numerados e demarcados com o espaço
exato que tinham antes de ser destruídos. Era o local onde os prisioneiros
dormiam, uma espécie de beliche de três andares em madeira. Também são visíveis
as casas de banho comuns, que nunca chegaram a ser suficientes para o número de
pessoas que ali coabitavam, sem qualquer tipo de privacidade ou condições de
higiene. Inicialmente cada prisioneiro podia tomar banho uma vez por semana e
de forma muito limitada. Quando o campo começou a sobrelotar, até essa vez
deixou de acontecer.
Ao fundo do campo, passando pelas
marcas de onde estavam os “barracões”, como que numa parte anexa, podemos
encontrar o crematório. Só os prisioneiros que lá trabalhavam é que tinham
noção de que os corpos de milhares de seres humanos eram queimados ali.
Atualmente, este é o local de maior respeito a todos os que naquele sítio foram
vítimas de discriminação e racismo.
Também como forma de homenagem,
existem vários monumentos religiosos e obras de arte. No fundo, pretendem
simbolizar a igualdade, a paz e a coexistência.
É importante dizer que hoje
podemos visitar estes campos de concentração pela força e coragem dos
sobreviventes do holocausto que não permitiram que fossem destruídos. Na
verdade, cada um deles deu-nos a oportunidade de poder aprender mais, de os
relembrar e sobretudo de não permitir que algo assim volte a acontecer no
mundo. Volto a sublinhar: é duro, mas todos devemos visitar um campo de
concentração pelo menos uma vez na vida.
Como chegar a Dachau
Carro: Fica a cerca de 25km de carro de Munique,
aproximadamente 20 minutos. Deixar o carro no parque tem um custo de 3€.
Transportes: Basta apanhar um comboio na Hauptbahnhof
(estação central de Munique) com direção a Petershausen e sair em Dachau
Bahnhof – este trajeto leva 20 minutos. Já em Dachau, é necessário apanhar um
autocarro 722, 724 ou 726, que são aqueles que param no campo de concentração.
Certamente se tiveres alguma dificuldade, alguém te encaminhará.
Como visitar Dachau
O
campo de concentração de Dachau pode ser visitado diariamente (com exceção de
24 de dezembro) entre as 9h e as 17h. A entrada é gratuita, no entanto, há três
formas de poderes fazer a tua visita:
Livre: Podes simplesmente entrar e ler a informação
disponibilizada nos placares, placas e vídeos (apenas escrito em alemão e
inglês);
Audio Guide: Tem um custo de 3.50€ e está disponível em 12
línguas, incluindo em português. Tem uma duração de 3 horas e as primeiras duas
são a mesma informação que vão encontrar nos painéis;
Guia: Há duas tour diárias com guia, uma pelas 11h e outra
pelas 13.30h, também com a duração de 3 horas e com um custo de 3€. É
necessário estar no local 15 minutos antes da visita começar e o ideal será
fazer marcação prévia no site oficial.
Não há uma forma preferencial de fazer a visita, basicamente
devem optar pela que vos parece mais favorável. No meu caso, gosto de fazer
este tipo de visitas com guia, pois são mais elucidativos e passam a mensagem
de uma forma mais emotiva. Desta vez, por uma questão de horários não foi o
caso, mas será certamente numa próxima oportunidade.
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